domingo, 9 de outubro de 2011

A Sala nº 6

A novela escrita por Anton Pavlovitch Tchekov e publicada em 1892, a Sala nº 6, (leia aqui em Francês ou aqui em Português, e o trailer do filme) constitui uma reviravolta na sua obra. Tchekov formou-se na faculdade de medicina de Moscovo e esta sua actividade profissional inspirou a sua obra de novelista e dramaturgo, tornando-se Tchekov num exímio analista dos males da sua época e dos seus contemporâneos. Ao longos dos anos, Tchekov foi burilando uma nova estética imbuída de realismo e simbolismo (movimento que procurava ver a vida sem ilusões, focando-se nos seus aspectos sórdidos e deprimentes, tendo Charles Baudelaire como seu máximo representante), movimentos estes que se mostraram muito activos em França com a sua longa tradição cultural. O diálogo entre o Dr. Raguine e Gromov, o doente mental, tem como fim mostrar o mau funcionamento da sociedade (do seu tempo, mas os seus males subsistem, helas!), do seu fracasso e consequente desilusão de um futuro risonho.

Anton Tchekov (esquerda) e Maximo Gorki. Crédito imagem: larouss.fr


Leiam este excerto [tradução minha do texto Francês. AZ]

Gromov- Porque me retém você aqui?
Dr. Raguine - Porque você está doente.
-Sim, estou doente. Mas dezenas, centenas de loucos se passeiam em liberdade porque a sua ignorância é incapaz de os distinguir dos sãos. Porque esses infelizes e eu devemos aqui permanecer fechados em lugar de todos os outros, como bodes expiatórios? Você, o enfermeiro, o gestor, e toda a restante escumalha do hospital, todos vós sois, sob o ponto de vista moral, incomensuravelmente mais vis que qualquer um de nós. Porque somos nós, nós, e não vós? Onde está a lógica?
- Os pontos de vista moral e lógico nada têm a ver aqui. Tudo depende do acaso. Aquele que nós aprisionamos, fica retido, e aquele que não retivemos, passeia-se, é tudo. No fato de que eu sou o médico e você o doente mental, não há nem moral, nem lógica, mas um simples acaso.
[...]
Vincent Van-Gogh, Starry Night over the Rhône.

Nos tempos que correm, este texto faz pleno sentido.
AZ

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