Basicamente o mundo caminhou desprevenido para a situação em que se encontra porque confiou ingenuamente nas doutrinas económicas dominantes. Por que raio deveria agora acreditar que essas mesmas ideias conseguirão tirá-lo do buraco em que se encontra, quando elas persistem num tão grande desconhecimento das realidades das economias contemporâneas?
João Pinto e Castro
João Pinto e Castro escreveu na semana passada no Negócios um artigo de opinião de leitura muito recomendável onde recupera algumas das principais criticas às teorias económicas dominantes e aos seus praticantes. Vinca, em particular, a forma despreocupada como a microeconomia e muitos dos seus fundamentalistas se refugiam em modelos e se demitem de questionar e conhecer a realidade.
O debate em torno dos falhanços da economia e dos economistas "dominantes" vai já longo, como nos lembra o embate de 2009 entre John Cochrane e Paul Krugman. Enquanto jornalista, uma das dimensões desta discussão que JPC recupera e que me detém mais tempo é uma dúvida muito prática: em que economistas confiar?
Este problema é da maior relevância para um jornalista de economia, já que a sua existência apenas se justifica pelo mandato atribuído pelos leitores para que procure, no limite das suas capacidades, descrever com bom-senso a realidade económica. Assim, quem ouvir e que relevância atribuir às várias posições sobre, por exemplo, a necessidade de reestruturar a dívida pública na Grécia ou sobre as probabilidades de sucesso dos programas de ajustamento dos países periféricos?
Não haverá respostas cabais sobre esta questão. Mas uma boa regra poderá ser, para cada economista, procurar conhecer os contributos que foi dando ao longo dos anos para a reflexão económica. Por exemplo: com que humildade enfrenta as muitas limitações da sua ciência e o que fez para as ultrapassar; ou com que coragem e consistência marcou o seu percurso face às modas e opiniões dominantes.
Considerando questões, e especificamente sobre a Zona Euro, há um economista que se destaca, quer pelos contributos académicos para a melhoria da sua profissão (veja-se, por exemplo, este artigo de 2008 sobre as limitações do famosos modelos dinâmicos estocásticos de equílibrio geral), quer por alguns dos seus textos de opinião escritos sobre o projecto de moeda única - e a este respeito aqui ficam excertos de um impressionante texto que assinou no Financial Times. Foi há 13 anos, em 1998 (tradução minha):
Suponham que um país, a que arbitrariamente chamamos Espanha, experimenta um “boom” mais forte que no resto da Zona Euro. Como resultado desse boom, a Produção e os preços crescem mais em Espanha do que em qualquer outro país. Isto conduz também a um “boom” no mercado imobiliário e uma inflação generalizadas dos activos em Espanha.
Como o BCE olha para informação ao nível da Zona Euro, não pode fazer nada para restringir as condições expansivas em Espanha. De facto, é até provável que a existência de uma união monetária intensifique a inflação dos activos em Espanha. Sem risco cambial grandes quantidades de capital são atraídos vindos da restante zona euro.
Os bancos espanhóis, que ainda dominam o mercado espanhol, são puxados para o jogo e aumentam o crédito concedido. São a isso estimulados pelas altas taxas de rendibilidade dos preços sempre crescentes dos activos, e pelo facto de, numa união monetária poderem pedir dinheiro emprestado à mesma taxa de juro que os bancos alemães, franceses, etc...
Depois “boom” vem o rebentamento. Os preços dos activos colapsam, creado uma crise no sistema bancário espanhol.
Vale a pena ler todo o artigo de Paul De Grauwe, onde, em plena euro-euforia, se fundamenta por que é que a Europa pode sofrer uma crise financeira semelhante à Asitática do final dos anos 90. Qualquer semelhança com a realidade não é coincidência. É economia.
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