Numa tentativa de compreensão da situação mundial e, em particular, do nosso país desde há pelo menos cerca de dois séculos, encontro um texto de Fernando Pessoa, recentemente dado a conhecer num livro intitulado "Organizem-se! A Gestão segundo Fernando Pessoa" (numa edição de Filipe S. Fernandes, pela Oficina do Livro). É mais que evidente que os burocratas, os gestores, que anteriormente desempenhavam um papel subalterno na sociedade, são hoje os homens que ditam a lei ao serviço das corporações. "É a lei! Há que obedecer!", e todo este discurso vem acompanhado com o odor da organização científica, (hoje em dia o que é dito "científico" vem desvirtuado, é imposto para dominar o Homem).
Mas vejamos o que o Fernando Pessoa concluiu sobre a nossa desgraçada situação (diferente da dos outros países, como ele próprio concluiu):
A questão que naturalmente se nos coloca é: porque terá ficado Pessoa em Portugal?, país claramente depauperado em elementos humanos criativos, em número suficiente para propiciar uma mudança radical desta pobreza moral e espiritual em que estamos mergulhados (onde falta a "massa crítica", como se diz em Física). Confrontados com a profundidade da crise em que estamos mergulhados (não só financeira, como vimos) desde há muito, vê-se a pequenez da ação e da visão do atual governo. Que não tem nenhuma.
Trabalho há muitos anos no meio universitário e confesso tristemente a debilidade intelectual e moral da maioria dos seus elementos. Há sempre excepções, conheço alguns, apenas um punhado na minha escola, mas todos esmagados por uma sub-espécie (no sentido que o Pessoa parece reconhecer) que envenena esta país. Também neste meio se escolhe as pessoas a dedo, com a conivência do anterior Ministério Gago, com a ignorância provável do atual. É possível mudar esta situação e esperar um futuro auspicioso? Os constrangimentos são fortes. Guardo a opinião para mim, mas consta que o Pessoa por aqui se deixou ficar depois de muito ter tentado (trabalhava para uma firma inglesa, tentou entrar na universidade mas não teve permissão,...) e quando se deu conta já era demasiado tarde. E por aqui de deixou morrer. Bebeu que se fartou para aliviar a dor. Não deixando de pronunciar no leito de morte as suas últimas palavras em Inglês...
Bom, resta-me agora apenas deixar aqui uma singela homenagem a este grande homem que entre nós viveu e criou, apesar de tudo. Um excerto da ode “Segue o teu destino”
Mas vejamos o que o Fernando Pessoa concluiu sobre a nossa desgraçada situação (diferente da dos outros países, como ele próprio concluiu):
Encarando o problema português com o mesmo critério, e, portanto, com o mesmo propósito de simplificação, constata-se, sem grande trabalho, que na nossa vida nacional se deu uma grande ruptura de equilíbrio, e, muito depois, duas outras perturbações, de carácter secundário, e subsidiárias daquelas.
Onde quer que se coloque o início da nossa decandência-da decadência resultante do formidável esforço com que realizámos as descobertas e as conquistas-, aí se deve colocar o início da grande ruptura de equilíbrio, que se deu na vida nacional. Com a dispersão por todo o mundo, e a morte em tantos combates, precisamente daqueles elementos que criavam o nosso progresso, o nosso pequeno povo foi pouco a pouco ficando reduzindo aos elementos apegados ao solo, aos que a aventura não tentava, a quantos representavam as forças que , em uma sociedade, instintivamente reagem contra todo o avanço. É um dos casos mais visíveis da criação de uma predominância das forças conservadoras. Com isto, visto à luz do que se explicou, queda revelado o porquê da nossa decandência.
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Fernando Pessoa jogando xadrez. |
A questão que naturalmente se nos coloca é: porque terá ficado Pessoa em Portugal?, país claramente depauperado em elementos humanos criativos, em número suficiente para propiciar uma mudança radical desta pobreza moral e espiritual em que estamos mergulhados (onde falta a "massa crítica", como se diz em Física). Confrontados com a profundidade da crise em que estamos mergulhados (não só financeira, como vimos) desde há muito, vê-se a pequenez da ação e da visão do atual governo. Que não tem nenhuma.
Trabalho há muitos anos no meio universitário e confesso tristemente a debilidade intelectual e moral da maioria dos seus elementos. Há sempre excepções, conheço alguns, apenas um punhado na minha escola, mas todos esmagados por uma sub-espécie (no sentido que o Pessoa parece reconhecer) que envenena esta país. Também neste meio se escolhe as pessoas a dedo, com a conivência do anterior Ministério Gago, com a ignorância provável do atual. É possível mudar esta situação e esperar um futuro auspicioso? Os constrangimentos são fortes. Guardo a opinião para mim, mas consta que o Pessoa por aqui se deixou ficar depois de muito ter tentado (trabalhava para uma firma inglesa, tentou entrar na universidade mas não teve permissão,...) e quando se deu conta já era demasiado tarde. E por aqui de deixou morrer. Bebeu que se fartou para aliviar a dor. Não deixando de pronunciar no leito de morte as suas últimas palavras em Inglês...
Bom, resta-me agora apenas deixar aqui uma singela homenagem a este grande homem que entre nós viveu e criou, apesar de tudo. Um excerto da ode “Segue o teu destino”
“Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
(…)
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.”
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.”
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
(…) Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim. (…)”
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim. (…)”
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