terça-feira, 14 de maio de 2013

Por onde andam os HOMENS deste país?

[Texto original de Miguel Sousa Tavares, ler aqui.]
Por onde andam os HOMENS deste País?
Com este título, Miguel Sousa Tavares publicou no Expresso, uma violentíssima crónica que divulgo.
É importante que se repita, cem vezes se necessário for, que estamos nas mãos de um louco, acolitado por dois incompetentes.
 
 
 
‘Pode, se o deixarem à solta: é o que Vítor Gaspar está há quase dois anos a tentar fazer a Portugal. Ele dará cabo do país e não deixará pedra sobre pedra se não for urgentemente dispensado e mandado regressar à nave dos loucos de onde se evadiu.

Já suportámos tudo a Vítor Gaspar: nove trimestres consecutivos de previsões sucessivamente falhadas; erros de avaliação de uma incompetência chocante; subidas de impostos que conseguiram o milagre de fazer cair a receita fiscal; meio milhão de novos desempregados em menos de dois anos e milhares de empresas chutadas para a falência; cortes cegos em tudo o que estava em marcha para mudar o nosso paradigma de país subdesenvolvido — como a aposta na investigação, na ciência, nas novas tecnologias, nas energias alternativas; um despudor e uma arrogância a corrigir os erros cometidos com novos erros idênticos, que, mais do que teimosia e obstinação suicidarias, revelam sim o desespero de um ditador intelectual perdido no labirinto da sua ignorância. Gaspar não sabe como sair do desastre em que nos meteu e, como um timoneiro de uma nave em rota de perdição, ele já não vê nem passageiros nem carga, ou empregos e vidas a salvar: prefere que o navio se afunde com todos a bordo e ele ao leme. Sem sobreviventes nem testemunhas.

Vendo-o na sua última aparição pública, a dar conta das linhas orientadoras do DEO, percebi que ele já não tem rumo nem bússola. Nem sequer tem linhas orientadoras da estratégia orçamental ou do que quer que seja. Apenas tem um número, que, aliás, vai sucessivamente engrossando à medida que o desastre se vai tomando cada dia mais nítido: 1,3 mil milhões, 4 mil milhões, 6,5 mil milhões. Cada nova previsão falhada, cada novo erro de avaliação por ele cometido, tem como consequência, não um pedido de desculpas ou a promessa de se render e arrepiar caminho, mas antes a ameaça de mais e mais sacrifícios sobre uma economia e um povo exauridos. Afinal, anuncia ele agora, a recessão não vai inverter-se no final deste ano, como previra, mas só lá para 2015 ou 16; afinal, o "desemprego ainda vai subir antes de começar a descer" daqui a uns dois anos, talvez; afinal, a "sustentabilidade das contas públicas", que nos diziam iminentemente assegurada, vai exigir sacrifícios "para uma geração". Mas o que mais me choca ainda é o tom nonchalant com que debita as novas ameaças, como se, milhão a mais milhão ou a menos, dois anos a mais ou dois anos a menos, não fizesse grande diferença nas vidas concretas de gente concreta, destruídas a mando da sua incompetência.

Sim, incompetência: porque o mais extraordinário de tudo é pensar que Vítor Gaspar impôs ao país uma política de austeridade suicida que o conduziu a uma das maiores recessões da sua história e sem fim à vista e, em troca, não conseguiu as duas que ele e os demais profetas da sua seita de fanáticos juravam ir alcançar sobre as ruínas do país: nem fez a reforma do Estado nem controlou o crescimento da dívida pública — pelo contrário, perdeu-lhe o controlo.
 
Mas para onde foram então os 24.000 milhões de euros que as políticas de austeridade de Vítor Gaspar roubaram à economia, às empresas e aos trabalhadores e pensionistas, nestes dois anos ? Sumiram-se para onde, serviram para quê ?

Incompetência, porque tudo aquilo que Vítor Gaspar sabe fazer e faz, qualquer merceeiro, sem ofensa, sabe fazer: contas de somar e subtrair. Agora, faltam-lhe 6,5 mil milhões ? É fácil de resolver, basta agarrar numa caneta e num papel.

Ora, vejamos: conta de subtrair - tiram-se 2 mil milhões aos pensionistas e 3 mil milhões aos salários dos funcionários públicos. Temos 5 mil milhões, faltam 1,5.

Conta de somar: aumenta-se o IRS (o único imposto que ainda garante retomo acrescido na receita fiscal). Aí estão os 6,5 mil milhões - a "reforma do Estado". Mas alguém lembra então a Gaspar que isto vai significar menos consumo privado e que menos consumo significa mais falências, mais desemprego, mais subsídios de desemprego a pagar. Contrariado, Gaspar volta a agarrar na caneta e desenha nova "medida de estratégia orçamental", ou seja, nova conta de subtrair: tira-se meio milhão às verbas do subsídio de desemprego. E quando alguém lembra ao ministro que o subsídio de desemprego já foi reduzido na sua duração a um paliativo mínimo e as suas regras de acesso, de tão restritivas que são, apenas abrangem 45% dos desempregados, Gaspar responde: "Então, por isso mesmo, e, aliás, em obediência ao princípio da igualdade, diminui-se a prestação aos que a têm".


É assim que Vítor Gaspar governa o país, perante a aquiescência do primeiro-ministro e a cumplicidade do Presidente da República. Eles sustentam que tudo fará sentido e valerá a pena no dia em que Portugal regressar aos mercados.

Não é um sonho, é um delírio: quanto mais o PIB  cai mais sobe a dívida pública, calculada em percentagem do PIB. E, quando  olharem para nós, sem a “protecção” da troika, o que irão os mercados  ver? Um país em recessão permanente, com a dívida sempre a subir e governado por  Passos Coelho e Vítor Gaspar. Em que filme de aventuras é que eles aprenderam  que um país assim é salvo por filantropos? Não, Gaspar não nos vai levar de  volta aos mercados, a não ser em condições de estertor final; ele vai é  levar-nos de volta a um novo resgate. E esse vai fazer-nos retroceder cem  anos.
Há alternativa? Há, tem de haver. É isso que o  novo primeiro-ministro italiano, Enrico Lette, anda a dizer pela Europa fora:  tem de ser possível fazer a reforma financeira dos Estados e fazer aceitar os  sacrifícios necessários para tal, desde que, em contrapartida, tudo o que os  governos tenham para oferecer não seja uma geração de sacrifícios, como anuncia  displicentemente Vítor Gaspar. Porque, como disse Leite, aquilo que não faz  sentido e que é intolerável é continuar com políticas que geram taxas de  desemprego de 15, 20, 25% e de desemprego juvenil entre 30 a 50%. Pode ser que  na nave dos loucos onde se produzem génios da dimensão de um Vítor Gaspar se  tenha congeminado a tese final do capitalismo triunfante: uma economia sem  trabalho e sem trabalhadores. Às vezes dá-me mesmo a ideia de que sim, mas é  preciso que a loucura deles seja da estirpe mais perigosa de todas para  imaginarem que a Europa e qualquer uma das suas nações sobreviverá assim e  pacificamente.
Mesmo com um Governo italiano arrastando ainda e  uma vez mais o fantoche de Berlusconi, mesmo com uma França chefiada pelo triste  Hollande ou uma Espanha chefiada pelo incapaz Rajoy, mesmo com a Grécia de  Samaras, a Europa do sul está finalmente a mover-se, por instinto de  sobrevivência. Sem perder tempo, Lette foi direito à origem do mal: a Berlim e a  Bruxelas. Ele não fará abalar Angela Merkel nas suas convicções e interesses  próprios e não conseguirá também fazer com que Durão Barroso deixe de oscilar  conforme o vento, até ficar tonto. Mas, se conseguir unir o sul e juntar-lhe  outros povos acorrentados pelos credores e condenados à miséria, enquanto o  norte prospera sobre a ruína alheia, de duas uma: ou a Europa se reconstrói como  uma livre associação de Estados livres ou implode às mãos da Alemanha. Qualquer  das soluções é melhor do que esta morte lenta a que nos condenaram. (…)
É claro que nada disto dá que pensar a Vítor  Gaspar, que vem de outro planeta e para lá caminha, nem a Passos Coelho, que  estremece de horror só de pensar que alguém possa desafiar a autoridade da sua  padroeira alemã. Nisso também tivemos azar: calhou-nos o pior país para viver  esta crise. Mas este Governo vai rebentar, tem de rebentar. Porque a resposta à  pergunta feita acima é não. Não, um homem sozinho não pode dar cabo de um país  com quase nove séculos de história.

 

2 comentários:

  1. Caro Abraão

    Julgo que o texto não estará completo? Ou termina ....a não ser...
    ftavares

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  2. Caro Fernando Tavares,
    Tem toda a razão, trunquei por lapso o texto, que agora sai completo. Muito obrigado pela chamada de atenção!

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